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Eu, Ele

Atualizado: 29 de abr. de 2020

Poema de karin poetiza

Como poderei, neste momento,

neste desalento, nesta angústia,

arrancar de mim, de dentro de mim,

o monstro que em mim germinou!

Desenvolveu-se, absorvendo-me,

crescendo em minhas carnes,

infiltrando-se em meus ossos?

Terei eu, fraca, triste e louca,

a força, a coragem, o escrúpulo,

para extirpá-lo, para erradicá-lo,

sem que dele restem, arraigados,

restos, permanecentes pedaços,

em minhas carnes e ossos?

Perambulo de um lado ao outro,

entre o norte são e o insano sul;

da gelidez polar ao ardor desértico,

do desespero, da mortalidade...

Enquanto eu a esmo, vagueio,

ele sussurra, ele geme, ele GRITA!

E, ao mirar-me no espelho,

eu o vejo gargalhando,

sarcasticamente me desafiando,

a destruí-lo, a aniquilá-lo.

Ah, como eu o odeio!

Como me desprezo por haver permitido

que tão hediondo e repugnante ente,

Dentro de mim, nascesse;

Em mim, prosperasse.

De dentro de mim, irrompesse!

Eu o reconheço, agora, à minha frente!

Fito seu escárnio esvaindo-se

de sua bocarra em rubro salivar...

Aspiro seu asqueroso fedor

emanando de seus poros,

das dérmicas protuberâncias,

dos apêndices córneos e escamosos.

Ouço o meu próprio brado,

um desumanizado berro

de minha humanidade roubada!

De minha humanidade devorada,

humilhada e desprezada

pelo tétrico e peçonhento demônio!

Ser que estende suas aterradoras garras,

entregando-me afiadíssimo punhal,

armando-me para o desfecho,

para a abjeta conclusão de seu domínio.

Aceito e empunho o infernal gládio e,

em um único gesto, fendo meu abdome!

Dele, vertem nojosas vísceras,

que se espalham pelo chão, e caio

entre a imundície de pedaços, fluidos,

em meio a urros, risos, impropérios!

Agonizante, percebo que, quem morre,

sou eu. Sou eu quem tomba, refletida,

aprisionada no terrífico espelho!

Ele? Ele vive. Totalmente liberto de mim.


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